Sexta-feira, 29 de Maio de 2009

 

O dobrar dos sinos

ecoou

no silêncio dos beirais,

bateu nas sacadas,

fez ricochete

e esgueirou-se, lodoso e esguio,

até se esgotar nas sombras do laranjal.

 

À mesa,

os talheres quedaram-se solenes

num enlace desampado

as mãos recolheram-se expectantes

num abraço côncavo

e ficaram-se.

 

Lá fora os campos de arroz

espelhos de água

rachados a meio

pelo fio bulicioso da auto-estrada

continuaram desafiadores

a encará-la.

 



publicado por Mnemosine às 20:42 | link do post | comentar

Domingo, 24 de Maio de 2009

 

The Secret Scripture de Sebastian Barry é daquele tipo de livros que se lêem num folêgo e ficam a ressoar em nós por muito tempo, depois de fecharmos o livro.

A trama fundamental  da história organiza-se em torno de uma mulher centenária, residente no hospital psiquiátrico de Roscommon, a qual,  por intermédio da escrita secreta de uma espécie de memórias, busca o apaziguamento da dor que existiu na sua vida. Apesar de ser intenção de Roseanne tornar esta sua actividade secreta, os registos acabam por ir parar à mesa do médico psiquiatra, doutor Grene, que nesse momento estuda o caso desta paciente para averiguar os motivos que conduziram ao seu internamento. O médico pretende apurar se Roseanne McNulty deve acompanhar o grupo de pacientes a ser transferidos para as instalações de um novo hospital.  Grene deligencia esta mudança de instalações tomado pela dor e confusão, resultante do falecimento recente da sua mulher e, na sequência, do rememorar de vivências traumáticas da sua infância.

Os relatos de vida destas duas almas em tormento, acabam por se ir embrincando até entroncarem numa mesma história que tem nos grandes acontecimentos da História recente da Républica da Irlanda, as suas coordenadas espacio-temporais. Em particular a vida de Roseanne que é a que primeiro sofre o impacto daqueles acontecimentos, por um lado, e por outro a sordidez de carácter das pessoas com quem ela se irá cruzar e que são as mesmas que a deveriam proteger. Apesar do imenso sofrimento da sua vida, o sofrimento que nunca desaparece, Roseanne tem a sabedoria de considerar que a sua dor é pequena quando comparada com a imensa dor do mundo. E conclui:

 

Um homem que se consegue fazer feliz, apesar dos desastres que vêm ao seu encontro, como vêm ao encontro de tantos, sem misericórdia nem favor, é um verdadeiro herói.

 

Ficamos a saber que há vida para além da dor; que  é fundamental confiar na Vida, que é arrogante, na sua altivez, mas magnânima, na sua capacidade de, a todos os momentos,   nos surpreender.

 



publicado por Mnemosine às 12:20 | link do post | comentar

Terça-feira, 19 de Maio de 2009

 

São faróis, os rostos

que encontro nesta nortada.

Projectam a exacta coordenada,

duma rota volante,

que me leva errante

a velejar.

 

São linhas de fogo, os rostos

que encontro nesta jornada.

Desenham as linhas da pauta,

duma música inaugural,

que me leva flutuante

a dançar.

 

São fios de lua, os rostos

que encontro à chegada.

Entretecem um tapete cintilante,

duma escada rolante,

que me leva triunfante

a planar,

pelo ar.

 



publicado por Mnemosine às 18:17 | link do post | comentar

Segunda-feira, 11 de Maio de 2009

 

 

(...) os nossos rostos marcados pela faina, por decepções, pelo sucesso, pelo amor; os nossos olhos exaustos que continuam à espera, permanentemente à espera, ansiosamente à espera de algo na vida, que se esvai enquanto se espera - passa desapercebida, como um suspiro, como um lampejo - a par da juventude, da pujança, do romance das ilusões.

 

Joseph Conrad

 

Marlow, sempre loquaz, reflecte o sentido absurdo da vida, a mesma que nos retém numa espera ansiosa e permanente de algo indefinível.  E ainda que  saibamos que essa é  uma espera inútil, sem propósito, a verdade é que não se consegue concebê-la, a vida, doutra maneira. A  vida é essa espera permanente, absurda, a consumir-se, de antemão,  nessa mesma espera com fim anunciado.

A sabedoria de Marlow, feita de verdades contundentes.

 



publicado por Mnemosine às 21:06 | link do post | comentar

Quarta-feira, 6 de Maio de 2009

Desenrolar o novelo de estradas

que conduzem aos veios da serra.

Descer ao fundo dos vales

guiados por uma boa estrela.

E deixar cair, das alturas,

em cascatas de luz,

a solidão.

 

Estes montes espraiados,

num vai vem sombrio de ondas

que querem romper os horizontes fechados,

são uma epifania.

 

E em todo o lado a minha voz,

pede a Eco um grito,

gutural,

que te acorde para sempre

o teu sono

 

 

 

 



publicado por Mnemosine às 12:23 | link do post | comentar

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