O universo ficcional de Flannery O'Connor é feito de sinistra violência. As suas personagens são dominadas por uma loucura contida que, a determinada altura, jorra em violência crua e vingativa. Francis Tarwater em The violent bear it away tenta a todo custo fugir a um destino determinado pelo seu tio-avô, um fanático profeta, que o raptou e o preparou para seguir o caminho do pão da vida.
O rapaz pressentia que era esse o cerne da loucura do seu tio-avô, essa fome, e o que secretamente temia era que tal condição, pudesse ser hereditária, vir um dia assaltá-lo por dentro, e então seria desmanchado pela fome tal qual o velho, possuidor de um estomâgo com fundo roto de maneira que nada pudesse sará-lo ou enchê-lo, excepto o pão da vida.
Quando aquele, por fim, morre, Tarwater procura escapar a esse destino. Todavia, essa fome ingénita devora-o e domina-o, sem que este lhe possa escapar. Neste processo de aceitação, a personagem, querendo defender-se, espalha destruição e morte: o afogamento de Bishop no lago e, depois, o fogo que este vai deixando no seu rasto. Não é só a violência por ele gerada, mas também a violência que ele atrai a si. Por fim, é encurralado e acaba, entre as labaredas altas de Milton, por se reconciliar com a sua condição maldita. E é assim que toma o trajecto inverso da estrada, como um condenado.
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